1º Encontro Lady’s Comics – “Transgredindo a representação feminina nos Quadrinhos”

lady's Comics

Quadrinhos não são apenas para homens. É isso mesmo, mulheres produzem, leem e escrevem sobre quadrinhos. É isso o que a Lady’s Comics, site que desde 2010 discute e pesquisa a representação das mulheres nos quadrinhos, quer mostrar e debater no 1º Encontro Lady’s Comics – “Transgredindo a representação feminina nos Quadrinhos”, evento que reunirá quadrinistas, estudiosos e público em diversas atividades e discussões.

O objetivo  é transpor o meio online e fazer o primeiro evento a discutir mulheres e quadrinhos no Brasil. Durante esses quatro anos, o site administrado pelas jornalistas Mariamma Fonseca e Samara Horta e pela designer Samanta Coan, realizou um amplo trabalho não só de divulgação de trabalhos autorais como também de pesquisa e divulgação de como as mulheres tem sido representadas no universo da nona arte.

Embora as opiniões sobre essas questões sejam as mais diversas, há um consenso de que o que prepondera é uma forte estereotipação da figura feminina nos quadrinhos. O que se observa é que personagens femininas raramente são as protagonistas das histórias, relegadas a coadjuvantes que geralmente servem aos propósitos amorosos do personagem principal. Sem falar na postura sexualizada e delicada que são atributos qualificadores dessas personagens, então destinadas a esperar de maneira  banal e não raras as vezes fútil que o herói da história, o homem corajoso e destemido, salve o dia.

Esses esteriótipos influem também no mercado editorial, já que reforçam o senso comum de que quadrinhos são feitos de homens para homens. É raro encontrar trabalhos feitos por mulheres que despontem. Muitas vezes, as marcas do gênero acabam por relegar às mulheres o perfil de desenhar coisas fofas e delicadas, o que é um obstáculo para as artistas. Mulheres também gostam de terror e ação, como inclusive pode se observar uma série de trabalhos independentes feitos por mulheres, e que possuem estas temáticas.

Por isso, o encontro pretende reunir quem quer debater as formas de transgredir a representação feminina nos quadrinhos com mesas temáticas, uma exposição, uma oficina de fanzine, intervenções e, principalmente, reflexões e questionamentos sobre o assunto.

O evento já tem data e local: 25 de outubro, no centro de Belo Horizonte. Mas para que ele de fato ocorra, a Lady’s Comics precisa de uma forcinha para angariar com os custos do projeto, que está aberto para financiamento coletivo via Catarse. As recompensas para quem contribuir estão muito boas, entre bottons, cadernos, bolsa, marcadores e posters exclusivos ilustrados por artistas brasileiras que apoiam a causa.

Por enquanto as entradas para o encontro, que fazem parte das recompensas, já estão quase esgotadas. Mas, se a verba para a sua execução for superada, há a possibilidade de existir um segundo dia de atividades. Vale muito a pena apoiar este projeto, já que será o primeiro evento do Brasil que discutirá mulheres e quadrinhos, sendo este de suma importância para registrar a memória de todas aquelas que lutam para transgredir a representação das mulheres neste universo.

A programação do evento e as recompensas para quem contribuir podem ser conferidas pelo site:

http://www.catarse.me/pt/ladyscomics

Para conhecer mais sobre a Lady’s Comics, acesse o site:

http://ladyscomics.com.br/

Resenha da HQ Bordados

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Bordados é a terceira obra de Marjane Satrapi, lançada em 2010 pela Companhia das Letras. Mais uma vez a autora iraniana surpreende com uma narrativa dinâmica e gostosa, marcada pelo seu peculiar humor ácido e feminismo mordaz

O “bordar” iraniano seria equivalente ao nosso ao nosso “tricotar”, ou fofocar, além de possuir outra acepção importantíssima para as mulheres iranianas. A expressão bordado designa também a cirurgia de reconstituição do hímen, uma decisão pragmática para aquelas que não abrem mão de ter vida sexual antes do casamento mas que são coibidas a corresponder às expectativas moralistas do país.

Assim como em outros livros, Marjane traz histórias das mulheres iranianas de sua família e lembranças de sua  infância. A narrativa se passa nos momentos após os almoços de família na casa da avó de Marjane Satrapi, em Teerã. Eles terminavam sempre da mesma maneira:  enquanto os homens iam fazer a sesta, as mulheres lavavam a louça e se reuniam para tomar chá. Era um momento pelo qual todas esperavam avidamente, já que, longe dos homens, podiam compartilhar seus sentimentos, ambições e frustrações.

Marjane, a mãe, a avó e suas amigas começavam então a contar suas desventuras com os homens, o amor e sua cultura opressiva ao sexo feminino. Entre uma xícara e outra, cada mulher começava a desfiar suas experiências e opiniões pessoais, além de fofocar sobre a vida alheia. É interessante notar que nesse grupo cada mulher tem uma relação distinta com a moral e vivências amorosas bastante variadas, mas que no entanto sempre estão às voltas com o machismo e a tradição.

O traço simples e os textos em letra corrida acentuam a intimidade que a a narrativa promove. A sensação é de se estar participando do chá ao lado dessas mulheres. Constantemente me coloquei no lugar de cada uma delas em suas histórias, e até de de Marjane, que era então apenas uma criança. Entre casamentos azarados, virgindades roubadas, adultérios, frustrações, golpes e autoenganos narrados com bastante ironia, tem-se um misto de riso e tristeza.

Num episódio narrado pela avó, uma mulher entra em pânico antes do casamento porque perdeu a virgindade com o seu verdadeiro amor e tem medo de que o futuro marido descubra o fato justo na noite de núpcias. A avó sugere então que ela leve uma lâmina de barbear para a cama, grite muito durante o sexo e faça um pequeno corte em si mesma para simular o hímen rompido. A mulher aceita as sugestões, mas, na hora H, acaba cortando o testículo do marido. Todas caem na gargalhada porque o sujeito preferiu ficar quieto e casado do que correr o risco de virar piada dos amigos.

Com Bordados, desconstruímos uma série de visões comuns a respeito do Irã, principalmente sobre as mulheres. Ao contrário do que se imagina, muitas iranianas falam abertamente sobre sexo e discutem as tradições, procurando meios de serem livres. Seja por meio de estratégias, traições, cirurgias ou fugas, essas mulheres gritam suas opiniões, mesmo que secretamente e com muita frustração e sofrimento.

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Bordados

Autora: Marjane Satrapi

Editora: Companhia das Letras

136 páginas

R$ 39,00